terça-feira, 23 de setembro de 2014

GITA




Eu sou o Espírito que, nas profundezas da alma, insondável, habita cada ser, o princípio, o meio e o fim de todas as coisas, sua origem, sua vida e seu declínio.

Eu sou a ação no reino das forças, a sabedoria dos sábios e a luz dos olhos, o criador e o mantenedor do universo, sua origem e sua morte, o fim de tudo.

Eu sou o silêncio no mistério divino, a semente de todas as coisas, a força original de todas as forças, a origem de todos os seres, pois eu sou tudo, e sem mim nada existe.

Somente eu mesmo estou em todas as coisas: o universo inteiro dimanou de mim como minha própria manifestação.

Eu sou o Espírito, o princípio, o meio e o fim de todas as coisas, a força original de todas as forças a origem do ser em todos os seres.

(trechos do Bhagavad Gita)
http://www.pentagrama.org.br/pentagramas/2010/2

quarta-feira, 18 de junho de 2014

Noite Estrelada




Contemplei ao longe um grande ideal — e lá se foi o sossego de minh'alma.

Nunca mais estarei quite comigo mesmo...

Sempre atuará a gravitação do espírito...

Entrou-me no sangue da alma uma angústia cruel...

Sempre oscilará o heliotropismo do meu ser...

Lavra-me no íntimo incêndio roaz...

Feliz do homem profano — satisfeito consigo e com todo o mundo — esse infeliz!

Infeliz do iniciado — insatisfeito consigo mesmo — esse feliz!...

Aquele não conhece esfinges em pleno deserto — não conhece problemas...

Sorri-lhe o dia perene do seu plácido viver...

Mas o homem que pensa e ama — vive num ambiente de estranha agitação.

A sua noite é noite estrelada, sim — mas a treva é profunda e as estrelas altíssimas...

Todo pensar nos faz inquietos — todo querer nos abre saaras imensos.

Todo viver oscila entre o Getsêmani e o Gólgota...

Todo amor agoniza entre os braços da cruz...

Entretanto, melhor é o inteligente sofrer — que o estúpido gozar...

Prefiro gemer numa noite estrelada — a sorrir num dia sem mistérios...

Prefiro sentir o que adivinho — a dizer o que ignoro...

Prefiro escutar a filosofia do silêncio fecundo — a ouvir a sociologia do ruído estéril...

Mais belos são os mundos que, incertos, entrevejo — que a terra que imediatamente enxergo...

Creio mais no muito que ignoro — do que no pouco que sei...

Mais firme é a minha fé num universo ideal — do que esse cosmos real...

Mais me aliciam ignotos horizontes — do que realidades palpáveis...

Bandeirante do além — não repousa meu espírito na querência do aquém...

Não me interessa o que sei — seduz-me o que ignoro...

Mesquinho é o passado, trivial o presente — como me encanta o futuro!...

Contemplei ao longe um grande ideal — e lá se foi o sossego de minh'alma!...

Nunca mais terei sossego de mim mesmo...

Nunca mais estarei quite comigo...

Devedor insolvente — enquanto viver...

Empolgou-me a noite estrelada do Infinito...

Rebelaram-se as potências dormentes...

Impossível um tratado de paz...

Adoro, ó noite estrelada, teus astros longínquos!...

Por eles vivo... Luto... Sofro... Feliz...


Huberto Rohden

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Da economia do tempo




Comporta-te assim, meu Lucílio, reinvidica o teu direito sobre ti mesmo e o tempo que até hoje foi levado embora, foi roubado ou fugiu, recolhe e aproveita esse tempo. Convence-te de que é assim como te escrevo: certos momentos nos são tomados, outros nos são furtados e outros ainda se perdem no vento. Mas a coisa mais lamentável é perder tempo por negligência. Se pensares bem, passamos grande parte da vida agindo mal, a maior parte sem fazer nada, ou fazendo algo diferente do que se deveria fazer.

Podes me indicar alguém que dê valor ao seu tempo, valorize o seu dia, entenda que se morre diariamente? Nisso, pois, falhamos: pensamos que a morte é coisa do futuro, mas parte dela já é coisa do passado. Qualquer tempo que já passou pertence à morte.

Então caro Lucílio, procura fazer aquilo que me escreve: aproveita todas as horas; serás menos dependente do amanhã se te lançares ao presente. Enquanto adiamos, a vida se vai. Todas as coisas, Lucílio, nos são alheias; só o tempo é nosso. A natureza deu-nos posse de uma única coisa fugaz e escorregadia, da qual qualquer um que queira pode nos privar. E é tanta a estupidez dos mortais que, por coisas insignificantes e desprezíveis, as quais certamente se podem recuperar, concordam em contrair dívidas de bom grado, mas ninguém pensa que alguém lhe deva algo ao tomar o seu tempo, quando, na verdade, ele é único, e mesmo aquele que reconhece que o recebeu não pode devolver esse tempo de quem tirou.

Talvez me perguntes o que faço para te dar esses conselhos. Eu te direi francamente: tenho consciência de que vivo de modo requintado, porém cuidadoso. Não posso dizer que não prezo nada, mas posso dizer o que perco, o porquê e como, e eu te direi as razões pelas quais me considero miserável. No entanto, a mim acontece o que ocorre com a maioria que está na miséria não por culpa própria: todos estão prontos a desculpar, ninguém a dar a mão.

E agora? A uma pessoa para a qual basta o pouco que lhe resta, não o considero pobre. Mas é melhor que te conserve todos os teus pertences, e começarás em tempo hábil. Porque, como diz um sábio ditado, é tarde para poupar quando só resta o fundo da garrafa. E o que sobra é muito pouco, é o pior. Passa bem!

Sêneca